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Covid-19: Como Ficam os Contratos de Locação Comercial com o Decreto de Quarentena? - Honda, Teixeira, Rocha Advogados

Covid-19: Como Ficam os Contratos de Locação Comercial com o Decreto de Quarentena?

O País vive momentos de incerteza, a população experimenta um sentimento de ansiedade e angústia, misturado há dezenas de notícias, desde as mais negativas, àquelas que buscam estabelecer a ordem e demonstrar que há luz no fim do túnel – muito embora seja pacífico, que no momento não sabemos a extensão do túnel.

Todos os dias, são publicadas diversas medidas. Órgãos públicos e privados, juntos tentam traçar uma estratégia para abrandar os efeitos econômicos e humanitários ocasionados pela Pandemia deflagrada pelo COVID‑19.

Considerando essa situação temos buscado assessorar às empresas, indicando alternativas para minimizar os prejuízos.

Os Contratos de Locação Comercial são regidos pela Lei 8.245/1991, também conhecida como Lei do Inquilinato, aplicada diretamente à locação “do comércio de rua” e, por falta de disposição específica, às locações de lojas em Shoppings Centers (ainda que regida processualmente pela mesma lei), em consórcio com o Código Civil, em especial, em especial as cláusulas gerais da Boa-fé e da Função Social do Contrato.

O Estado de São Paulo possui o maior número de Shopping Centers do Brasil (182) e a maioria deles está na Capital. O conceito de Shopping Centers nasceu em 1966, para atender as necessidades da população, concentrando serviços em um só ambiente, quando se inaugurou o primeiro centro de compras – “Shopping Center” no Brasil, na cidade de São Paulo, chamado de Shopping Iguatemi.

Contudo, diante de um cenário de tanta imprevisibilidade e com uma ampla restrição de circulação da população (que gera o consumo dos shoppings), todos os setores serão afetados, de modo que o mercado imobiliário de locações comercias, seja em Shoppings Centers ou “lojas de rua”, foi um dos primeiros a ser fortemente impactado, principalmente após a publicação do Decreto de quarentena (vindo do Governo Municipal, Estadual e Federal), determinando o fechamento do comércio.

Diante disso, a primeira dúvida que se levantou foi a questão relacionada a obrigação de pagamento do aluguel, relativo ao período de fechamento do comércio. Tal fechamento claramente limita o direito de uso do imóvel locado, direito esse que é assegurado pelo artigo 22, II, da Lei de Locação, que diz “O Locador é obrigado a: II – garantir, durante o tempo da locação, o uso pacífico do imóvel locado;”, e constitui obrigação do Locador.

É certo que tal conceito permite desdobramento, haja vista que o imóvel continua em uso, visto que seu Inquilino possui plena disponibilidade de acesso e seus pertences e mercadorias, os quais estão lá armazenados. Contudo, seu propósito principal, estar aberto para a visitação do público, sofre restrição em virtude de determinação da Administração Pública – conhecido também como fato do Príncipe[1]. Fato esse também totalmente desvinculado da vontade do Senhorio (Proprietário-Locador), decorrente de acontecimentos extraordinários e supervenientes a celebração do contrato entre as partes, que podem gerar onerosidade excessiva à uma das partes.

Diante dessa celeuma, o melhor cenário que se avizinha é a composição entre as partes, que consensualmente podem aditar o contrato e estabelecer um período para redução do aluguel ou mesmo um prazo de carência, com ou sem compensação posterior, conforme dispõe os artigos 17 e 18[2] de Lei de Locação, combinados com princípios da boa-fé (CC, 422)[3] e equilíbrio contratual (CC, artigos 478, 479 e 480[4]).

O caminho da composição – ainda que por aditamento para prazo temporário – é viável mesmo para os contratos que preveem situações específicas. É sempre necessário analisar as situações individuais para verificar se há possibilidade de solução mais benéfica ou menos prejudicial para ambas as partes.

Nessa linha de solidariedade e esforço conjunto para alcançar um bem maior, mantendo os contratos e reduzindo o prejuízo de ambos os lados, mediantes concessões mútuas, na data de 24 de março, a ABRASCE – Associação Brasileira de Shopping Centers divulgou comunicado informando que não está alheia ao problemas do Lojistas e sugere uma solução negociada, evitando a judicialização dos contratos, ajustando a situação de acordo com a necessidade das partes, que leva em conta inclusive a praça e o perfil de cada um dos envolvidos.

A nota vai ao encontro do que noticiado pela imprensa no dia 20 de março, informando que a Associação Brasileira de Franchising buscou uma negociação direta com a ABRASCE, visando suspender o aluguel fixo, mantendo o proporcional. A atuação coletiva pode surtir grande efeito positivo, equilibrando a balança no ponto ótimo desta situação crítica para todos. Porém, a resolução individual pode ser um caminho mais rápido e vantajoso até que desenhe uma solução coletiva.

Todavia, caso outra alternativa não reste, que a judicialização do contrato, a Lei de Locação, em seu artigo 68 prevê a possibilidade de requerer a revisão do valor do aluguel, respeitado alguns requisitos, dentre eles o de que o valor do aluguel se encontra elevado, diante da nova realidade do mercado.

Caso tal não seja possível, por falta de preenchimento dos requisitos – e muito embora a Lei de Locação não traga especificamente a possibilidade de descumprimento da obrigação de pagamento de aluguel e rescisão unilateral do contrato sem aplicação da multa prevista em contrato[5] –, é possível com esteio no artigo 393 (caso fortuito ou força maior) e 480, ambos do Código Civil, requer judicialmente seja declarada a rescisão contratual, mediante a devolução do imóvel, sem aplicação da multa contratual prevista, considerando caso de força maior e a onerosidade excessiva.

Evidente que a regra de onerosidade excessiva aqui não é absoluta, uma vez que ambos os lados estão, no momento tendo prejuízo, de toda a forma, caberá a parte demonstrar que seu prejuízo é maior, diante do fechamento do comércio, o que a impede, pelo menos por determinado lapso de tempo, de cumprir com a obrigação assumida.

Portanto, o que se recomenda no momento, é buscar o diálogo com o proprietário do imóvel, e, esgotada a possibilidade, judicializar a questão, a fim de que o Judiciário, a considerar o ineditismo da situação, comece a discutir a questão e buscar uma homogeneização dos entendimentos.

[1] Celso Antonio Bandeira de Mello (2009) explica que se trata de “agravo econômico resultante de medida tomada sob titulação diversa da contratual, isto é, no exercício de outra competência, cujo desempenho vem a ter repercussão direta na econômica contratual estabelecida na avença”.

[2] Art. 17. É livre a convenção do aluguel, vedada a sua estipulação em moeda estrangeira e a sua vinculação à variação cambial ou ao salário mínimo.

Parágrafo único. Nas locações residenciais serão observadas os critérios de reajustes previstos na legislação específica.

Art. 18. É lícito às partes fixar, de comum acordo, novo valor para o aluguel, bem como inserir ou modificar cláusula de reajuste.

[3] Art. 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé.

[4] Art. 478. Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato. Os efeitos da sentença que a decretar retroagirão à data da citação.

Art. 479. A resolução poderá ser evitada, oferecendo-se o réu a modificar equitativamente as condições do contrato.

Art. 480. Se no contrato as obrigações couberem a apenas uma das partes, poderá ela pleitear que a sua prestação seja reduzida, ou alterado o modo de executá-la, a fim de evitar a onerosidade excessiva.

[5] Art. 4o Durante o prazo estipulado para a duração do contrato, não poderá o locador reaver o imóvel alugado. Com exceção ao que estipula o § 2o do art. 54-A, o locatário, todavia, poderá devolvê-lo, pagando a multa pactuada, proporcional ao período de cumprimento do contrato, ou, na sua falta, a que for judicialmente estipulada.

Glauber Julian Pazzarini Hernandes

ghernandes@hondatar.com.br

Leonardo Prado Ribeiro

leonardo.ribeiro@hondatar.com.br