Receita Federal dificulta desembaraço aduaneiro nos casos de reclassificação fiscal

Embora a normativa aprimore os mecanismos de combate a ilícitos aduaneiros, algumas dúvidas podem ser lançadas sobre sua licitude.

Por meio da Instrução Normativa (“IN”) RFB nº 2.014, publicada no Diário Oficial da União (DOU) de 24/03/2021, a Receita Federal regulamentou os procedimentos referentes ao despacho de importação de mercadoria sobre a qual se entende ter ocorrido erro de classificação fiscal.

Ao alterar a IN nº 680/2006, a normativa prevê a possibilidade de interrupção do despacho de importação nos casos em que for verificada a exigência de crédito tributário decorrente de reclassificação tarifária ou de alteração de tratamento administrativo em processos de importação anteriores realizados pela mesma empresa importadora/adquirente, desde que a exigência tenha sido formulada com base em laudo laboratorial emitido para mercadoria de mesma origem e fabricante, com igual denominação, marca e especificação.

Na prática, a nova regra obriga o importador a adotar a mesma classificação fiscal definida pela Receita Federal em processos de importação anteriores, para os quais houve a emissão de laudo laboratorial e exigência de créditos tributários (diferença de tributos não recolhidos e multas).

De acordo com as mudanças previstas na IN nº 2.014/2021, nestes casos, o importador ainda poderá (i) solicitar nova perícia para a mercadoria, condicionando o desembaraço aduaneiro ao resultado de novo laudo laboratorial, ou (ii) manifestar inconformidade em relação à exigência, o que ensejará a lavratura de auto de infração, permitindo o desembaraço aduaneiro mediante depósito administrativo dos valores exigidos.

Embora a normativa aprimore os mecanismos de combate a ilícitos aduaneiros, algumas dúvidas podem ser lançadas sobre sua licitude.

Primeiramente, a IN nº 2.014/2021 não vincula o Auditor-Fiscal às hipóteses em que a classificação fiscal correta seja aquela definida anteriormente pelo importador. Ou seja, o importador ainda poderá se ver sujeito à interrupção dos despachos de importação, mesmo que a classificação tarifária tenha sido anteriormente estabelecida por laudo pericial ou por decisão administrativa ou judicial transitada em julgado em seu favor.

Nesta esteira, a interrupção do despacho de importação dependeria da existência de crédito tributário pretérito formalizado com base tão somente em laudo pericial, não importando se a questão ainda está sob discussão administrativa ou judicial promovida pelo importador. Evidentemente, as novas regras podem reduzir a segurança jurídica assegurada ao importador, na medida em que poderão ser contrárias às determinações futuras provenientes dos contenciosos instaurados sobre o tema.

Em contrapartida, a própria Receita Federal tem a revisão aduaneira como ferramenta legítima para a exigência dos créditos tributários decorrentes de erro de classificação fiscal em importações pretéritas. Por isso, do ponto de vista estritamente arrecadatório, acredita-se seja dispensável o acirramento da fiscalização no curso dos despachos de importação, sobretudo em se tratando de mercadorias lícitas e que não trazem maiores prejuízos aos controles administrativos.

Além disso, permite-se compreender a interrupção do despacho de importação prevista na IN nº 2.014/2021 como uma obrigação da qual o Auditor-Fiscal não pode se esquivar. Com base nesta interpretação, a Receita Federal poderá parametrizar automaticamente em canal amarelo/vermelho todas as Declarações de Importações referentes a mercadorias para as quais já foi lavrado laudo pericial, ainda que o importador tenha acatado a determinação fiscal, o que certamente trará prejuízos ao fluxo logístico da importação.

Neste sentido, recomendamos aos importadores e operadores logísticos que se atentem às novas regras estabelecidas pela IN nº 2.014/2021, a fim de ajustar suas operações e expectativas de fluxos à nova realidade imposta pela Receita Federal.

A área de Comércio Internacional permanece à disposição para auxiliar as empresas e entidades de classe que desejarem maiores informações sobre o assunto.

AUTOR

Felipe Rainato Silva

Comercio Internacional

felipe.silva@hondatar.com.br

RESPONSÁVEL PELA ÁREA

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Comercio Internacional

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